segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Sobre nomes e sobrenomes

   "Leo, por que os nomes os seus personagens são sempre em inglês?"

   Me fizeram esta pergunta outro dia. Não sei se já perceberam, mas meus personagens são sempre Johns, Peters, Josephs e Franks, nunca Joões (sim, eu pesquisei), Pedros, Josés ou Franciscos. A resposta foi extremamente simples e direta. Porque eu acho nomes brasileiros feios.

   Isso mesmo. John (um dos meus nomes preferidos, a propósito) soa um zilhão de vezes melhor que João. Colocando isso numa situação prática:

- Finalmente, todas as peças do quebra-cabeça estão em seus devidos lugares. - disse John, com um sorriso triunfante no rosto.

- Finalmente, todas as peças do quebra-cabeça estão em seus devidos lugares. - disse João, com um sorriso triunfante no rosto.

   Qual dos dois soa melhor?

   Algumas pessoas podem achar isso estranho e, para ser bem sincero, eu não sei porque prefiro nomes em inglês. Mas quando estou escrevendo, os nomes sempre vêm dessa maneira naturalmente. Quando crio um personagem, John sempre vai vir antes que João.

   Claro, isso não significa que nunca vou escrever uma história que se passe no Brasil e os personagens que chamem João, Márcia, Rita ou Rafael. Vai que, né?

   Outro fato interessante sobre nomes de personagem: como todo bom jogador de rpg, quando estou fazendo a ficha, sempre deixo o nome por último. É sempre a parte mais difícil da criação de um personagem. Pensar nos atributos, habilidades, background, manias e trejeitos dele é fichinha comparado a nomeá-lo. Mas, quando crio um personagem para algum texto, o nome vem num passe de mágica. Às vezes penso no nome antes mesmo de pensar no personagem em si. Alguns de vocês devem ter lido Dead West (uma história zumbi/faroeste que escrevi há algum tempo). O ponto de partida de toda a história foi o nome do personagem principal, John Cassidy. Um belo dia, pensei nesse nome (totalmente do nada), achei que ele combinava com faroeste, joguei zumbis no meio da receita e deu no que deu.
  
   Também, o primeiro nome sempre é mais fácil de escolher que o sobrenome. Eu testo, no mínimo, uns três sobrenomes diferentes pra cada personagem. Alguns já surgiram com o nome completo, como o John Cassidy, mas isso é um caso extremamente raro.

   O engraçado é que isso só ocorre quando estou escrevendo. No dia-a-dia, nomes brasileiros soam perfeitamente normais (alguns muito bonitos, inclusive) para mim. Por isso meu filho se chama Eduardo, e não Edward (obrigado por arruinar esse nome, Stephenie Meyer).

   E sobre o meu nome, eu o acho... ok. Não tem nada especial, mas não é feio. Tem muitos nomes mais bonitos que Leonardo por aí, mas gosto do significado dele. Leão feroz. Legal, né?

   Mas se eu pudesse escolher... meu nome seria Lucifer. Acho esse nome perfeito, tanto na sonoridade como no significado.

   "Afe, é o nome do tinhoso" algumas pessoas dizem. Mas isso é mera coincidência.

   Ou não. (6)

terça-feira, 18 de setembro de 2012

A porta

 Se você é cheio(a) de mimimi pra violência, recomendo que ignore esse texto. =p
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   Mike estava sendo consumido pelo ódio, mas conseguiu não demonstrar.

- Você não consegue fazer nada direito, né?! - gritava Heather - Pelo amor de Deus, homem! Olhe para mim quando eu estiver falando!

   Ele olhava fixamente para baixo, como se estivesse disputando quem conseguia ficar mais tempo sem piscar com o chão. Havia ódio no olhar dele. Nitidamente. Quando levantou os olhos, o ódio tinha dado lugar a uma branda raiva.

- Você tá com raiva? Imagina como eu estou, agora que vou ter que limpar sua merda! - Heather continuava gritando.

   Mike era consultor de vendas de uma empresa. Trabalhava quarenta horas por semana, recebia seu salário, pagava suas contas e vivia tranquilamente. Tinha uma esposa e dois filhos, de oito e dez anos. Tricia e Daniel. Ele gostava de música clássica, filmes de faroeste, comida italiana e golfe. Corria todo dia, após acordar. Depois disso tomava seu café, se arrumava, deixava as crianças na escola e ia para o trabalho no seu carro esportivo. À noite, quando chegava em casa, jantava com a família e depois todos assistiam tv juntos. Tinha uma boa casa, num excelente bairro de uma ótima cidade. A casa tinha até cerquinha branca e um gramado impecável. Ele era o exemplo do sonho americano.

   Mas, nesta tarde, ele havia cometido um erro infantil no trabalho e estava ouvindo mais uma das famosas broncas da sua supervisora, Heather.

- Eu não estou pedindo pra você limpar nada, Heather. - respondeu, falando suavemente. Aquele tipo de fala suave que faz o ouvinte achar que a morte está chegando com a foice preparada para o ataque.

   Heather estremeceu um pouco, mas se recompôs.

- Eu sei que você não tá pedindo minha ajuda, porra! Mas eu tenho que limpar, ou vai acabar sobrando pra mim também!

   Ela gritava tanto que o rosto de Mike era coberto por uma chuva de saliva.

- Olha... - disse ela, se acalmando - Eu vou falar com o Harry sobre isso. Mas reze, reze muito para ele entender seu lado. Não posso fazer milagres.

   Mike não respondeu nada. Nesse momento, ele apenas abriu uma porta.

   Uma porta na sua mente.

   Uma porta escura, que passava a maior parte do tempo trancada. Aquela porta levava para um quarto escuro, pequeno e claustrofóbico. Um quarto habitado por demônios, desespero, loucura, pecado, morte. Um quarto onde ele podia viver suas fantasias mais hediondas. Um quarto onde só se ouviam gritos. Um quarto que cheirava a sangue e carne podre. Um quarto onde, nesse momento, Heather era torturada enquanto gritava. Onde Mike ria, assistindo as lágrimas dela se misturarem com seu sangue. Onde seus olhos eram arrancados vagarosamente, para que ela sentisse cada tendão se partindo, um a um. Onde sua língua era serrada e o sangue corria para a garganta, sufocando-a. Onde ela tinha seu ânus penetrado enquanto suas nádegas eram queimadas por pontas de cigarro. Onde seus mamilos eram mordidos e apertados e puxados. Onde ela gritava para morrer. Um quarto onde esse desejo foi atendido, depois de muita dor e sofrimento.

   Um quarto que existe na mente de todos.

   E tudo que nos impede de transformar essas fantasias em realidade é uma porta, simples e frágil.

   Quem nunca abriu esta porta e espiou o quarto escuro, que atire a primeira pedra.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Estrada solitária

Eu REALMENTE (e não posso destacar isso o suficiente, só se conseguisse que as letras piscassem e a moça do avast ficasse repetindo "REALMENTE REALMENTE REALMENTE REALMENTE") recomendo que vocês leiam esse texto ouvindo essa música.
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- Então, sobre o quê você queria falar? - disse George. Ele conseguiu não deixar transparecer, mas estava meio preocupado, como se desconfiasse que algo ruim estava por vir.

- Bom... eu só queria agradecer por tudo que passamos juntos. - respondeu Lionel, com um sorriso bastante sincero nos lábios - Eu sei que vocês estão meio confusos, mas vocês vão entender o que quero dizer.

   Lionel, George, Marcus, Ralph, Elmer e Frank eram bons amigos. Não havia tanto tempo que se conheciam, talvez uns quatro ou cinco anos, mas já haviam chegado a um nível de amizade que muitas pessoas poderiam considerar verdadeira. Tinham seus problemas, claro, mas, no geral, gostavam e confiavam muito um no outro.

Mas... há desentendimentos nas melhores famílias.

- O que tá acontecendo? - perguntou Elmer, nitidamente o mais preocupado dos seis. - Você sabe que pode con...

- Eu sei, Elmer. Eu sei. - respondeu Lionel, antes que Elmer pudesse completar o "contar conosco" - E eu realmente agradeço por isso. Mas esse é exatamente o problema.

   Eles se olharam confusos. Elmer estava prestes a falar algo quando Lionel o interrompeu.

- Se vocês me deixarem, eu vou explicar.

   Todos ficaram em silêncio.

- Nós nos divertimos muito juntos, heim? - começou Lionel, com outro sorriso extremamente sincero no rosto.

- Nós ainda não...

- Calma, vocês entenderão. Eu lembro muito da festa do Ralph... Aquela festa foi épica. Uma das melhores festas que eu já fui.

- Realmente foi muito boa - Frank falou pela primeira vez.

- Lembram da Claire, dando em cima de metade da festa?

- Quem não lembra disso? - disse Raplh, entre risadas - Aquela festa foi uma das melhores coisas que já fiz na vida.

- Pena que só você aqui viu o tal do OVNI, Lionel. - disse Elmer, e todos caíram na gargalhada.

- Tá, eu estava bêbado, mas não fui o único.

- Claro, vou acreditar nas palavras de um bêbado. - disse Marcus, rindo.

- Eu gosto muito de todos vocês, confio em todos vocês, mas existe algo que me incomoda nesse grupo. - disse Lionel, finalmente.

- O que você quer dizer? - Perguntou Frank.

- Eu mesmo. - respondeu Lionel.

- Como assim você mesmo? - Elmer parecia preocupado novamente.

   Lionel ficou em silêncio um tempo, e todos o olharam febrilmente, como se esperassem que ele revelasse o sentido da vida.

- Nós nos damos muito bem, apesar dos problemas. Mas nosso grupo é dividido.

- Dividido? - todos perguntaram ao mesmo tempo.

- Sim, temos três panelinhas aqui.

- Que panelinhas, cara? Você tá deli... - disse Marcus, de repente.

- Ralph, Elmer e Frank... Marcus e George... e eu. - disse Lionel, interrompendo.

- Quê? - todos pareciam que tinham acabado de ouvir o maior absurdo da face da terra.

- Não sei se vocês nunca perceberam ou estão se fingindo de idiotas, mas Raplh, Elmer e Frank têm suas festinhas particulares com outros amigos, às vezes. Eu sei que todos nós temos amigos fora daqui - Lionel continuou, antes que Ralph, Elmer ou Frank pudessem falar qualquer coisa - mas muitos desses amigos também são nossos amigos e nós nunca fomos convidados.

   Todos ficaram em silêncio.

- Não estou reclamando... na verdade eu nem me importo, e, se fosse convidado talvez nem fosse. É só uma observação. Vocês três parecem mais próximo uns dos outros do que com o resto de nós. E, novamente, não estou reclamando, isso é natural. Só quero mostrar que é inegável.

   Todos pareciam meio desconfortáveis, como se tivesse sido revelado que cada um deles já tinha falado mal dos outros pelas costas.

- Marcus e George são basicamente um casal. Um é confidente do outro e às vezes parece que nem suas namoradas sabem das coisas que vocês sabem sobre o outro. E isso também é natural, não acho que todos nós devemos confiar uns nos outros em níveis iguais. É só outra observação.

- Cara, não é pra tanto. - disse George.

- Sinceramente, não me importa muito se é ou não é pra tanto, porque é aí que entra o problema. - respondeu Lionel - Eu não ligo se vocês três são mais próximos - ele disse apontando para Ralph, Elmer e Frank - ou se vocês dois confiam mais um no outro do que no resto de nós. - disse apontando para Marcus e George - E esse é o problema. Eu. Eu não ligo.

- Como assim?

- Eu não ligo. Eu não me importo. Eu não me sinto tão próximo de vocês, ou de ninguém, minha confiança não é grande coisa e, por isso, eu não ligo. Isso deveria ser uma coisa ruim, horrível até, mas, eu também não ligo pra isso. - disse Lionel rindo. Essa foi a risada mais sincera que ele já deu em sua vida.

   Todos os outros olhavam pra ele espantado.

- Não estou dizendo que vocês são culpados disso ou que me excluam de propósito. Eu só não me encaixo aqui. Ou em qualquer outro lugar.

- O que você tá dizendo? É claro que você se enca...

- Caras, não comecem. Vocês sabem que isso é verdade. Vocês vêem como às vezes eu fico deslocado quando a gente sai. Como eu sou calado. Como eu nunca falo sobre o que acontece comigo. E isso não é culpa de vocês. Eu só me sinto bem sozinho. O lobo é meu animal preferido, pelo amor de Deus!

- Isso não quer dizer nada, eu também gosto de lobos. - disse George.

- Você vai ver com o tempo. - respondeu Lionel, dando uma piscada.

- E o que você quer dizer com isso tudo? - perguntou Elmer.

- Apenas isso. Que eu finalmente percebi quem eu sou e que estou me sentindo ótimo comigo mesmo. Que vocês não devem se preocupar ou achar que fizeram alguma coisa se eu me distanciar. É quem eu sou. E eu não tenho como fugir de mim mesmo.

- Você não precisa se distanciar. - Ralph disse, como se explicasse pra uma criança que dois mais dois são quatro.

- Eu sei que não preciso, mas isso pode acabar acontecendo. Só quero que vocês não se sintam culpados por nada, pois ninguém é culpado de nada aqui. Se isso acontecer, só significa que as coisas tomaram seu rumo natural.

   Todos ficaram calados por um tempo, como se tivessem acabado de saber que um parente muito próximo havia morrido.

- Qual é, caras, não é o fim do mundo. - disse Lionel, se levantando e pegando um cigarro na carteira.

- Não sabia que você fumava. - disse Elmer.

- Nem eu. - respondeu Lionel - Mas preciso fazer uma saída estilosa. - concluiu, se virando e começando a andar.

- Lionel, eu...

- Caras... não. Apenas não. - disse Lionel, parando, mas sem se virar - Não percam seu tempo, não vale à pena. É quem eu sou. - concluiu, voltando a andar.

- E quem você é? - Marcus perguntou.

   Lionel parou, acendeu o cigarro, deu uma longa tragada, expeliu a fumaça levantando a cabeça e, embora ninguém pudesse ver, estava sorrindo.

- I'm a lone wolf. - respondeu, levantando a mão esquerda como se desse tchau pra quem está atrás dele. E então voltou a andar, cantando - Mama... it's a lonely, lonely road... I gotta do this on my own... It's a lonely, lonely road...

   Lionel estava, pela primeira vez na sua vida, feliz consigo mesmo.