quarta-feira, 12 de outubro de 2011

 Mais do que nunca, esse texto faz sentido. Não o escrevi com essa intenção, mas ele se encaixa perfeitamente neste momento.
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- Pai, por que tá todo mundo chorando?
- Porque o vovô se foi, filho.
- Mas ele não vai voltar?
Jacob tinha apenas 4 anos, ele não entendia o que era morte. Ter que explicar isso para seu filho era um sacrifício para Tom.
- Senta aqui, campeão.
Ele se sentou no colo do pai, com o olhar mais inocente e interessado do mundo.
- Lembra quando o papai explicou pra você como você tinha nascido?
- Lembro.
- Então, as pessoas nascem, ou "vêm" para o mundo, mas elas também morrem, ou "vão embora". Só que esse "ir embora" é para sempre.
- Então o vovô não vai voltar?
- Não, Jake. Dessa vez o vovô não volta.
Jake olhou para as próprias mãos, que estavam repousadas em cima de suas coxas. Um olhar profundamente triste toma conta de seu rosto, e Tom sentiu um nó na garganta.
- Mas eu gostava tanto dele, papai.
- Eu sei, Jake. Todos nós gostávamos. E ainda gostamos, não é? Não é só por que ele se foi que vamos deixar de gostar dele.
- É... acho que sim. Mas para onde ele foi?
- Ele foi pra perto do papai do Céu, filho.
- Ah... mas e se os médicos trouxerem ele de volta?
- Os médicos já fizeram tudo que podiam, Jake. Infelizmente, não há mais nada.
Jake simplesmente abaixou a cabeça e voltou a observar suas mãos.
- E se eu tentasse, papai?
Tom sentiu que ia desabar. Era difícil demais fazer isso. Ele tinha forças para suportar a dor de peder um pai, mas não de ver seu filho passar por isso. Ele abraçou Jake e começou a chorar.
- Pai, o que foi? Me desculpa, não queria fazer o senhor chorar.
- Jake...
Quando se acalmou, ele tentou explicar que não havia mais nada que eles pudessem fazer.
- Filho, o vovô já foi. Eu também queria muito que ele voltasse, mas não vai ser possível.
- Já sei!
Jake se levantou e saiu correndo. Vinte segundos depois ele voltou correndo com o celular do pai nas mãos, sorridente.
- Vamos ligar pra ele, papai! Se eu falar com ele, sei que ele vai querer voltar.
Foi a gota d'água. Tom abraçou Jake com força e voltou a chorar. Por mais que o garoto não entendesse o que estava acontecendo, ele sabia que Jake era quem mais estava sofrendo aquela perda. Depois de algum tempo, ele se recompôs e tentou explicar novamente para Jake o que havia acontecido.
- Filho, onde o vovô está não tem telefone. Não existe nenhuma maneira para falarmos com ele, porque para o lugar onde ele foi, não tem volta.
- É muito longe?
- É o lugar mais longe que existe.
- Então ele foi pro Japão?
- Não, Jake. É mais longe que o Japão.
- Ele tá na lua?
- Também não. É mais longe que qualquer lugar que você possa imaginar.
- Então se ele não vai voltar, eu não vou ganhar presente, certo?
- Certo.
- Poxa... mas eu nem queria presente, só queria que ele voltasse. Só isso já seria o melhor presente do mundo.
Isso era doloroso demais para Tom. Ele precisava acabar com isso.
- Jake, quer se despedir dele?
- Ele tá aqui?
- Mais ou menos. O corpo dele está aqui, mas está dormindo e não vai acordar. Porque a mente dele foi para aquele lugar mais longe que existe, entende?
- Acho que sim... Mas onde ele tá?
- Logo ali, vamos.
Tom segurou na pequena mão de Jake e o conduziu ao caixão. Por mais mórbidos que caixões sejam, ele não podia deixar de reparar na beleza que aquele tinha. Era uma peça muito bem trabalhada em madeira reluzente, com alças adornadas em ouro e as inscrições "Thomas Cross, marido, pai e avô amado. Que proteja sua família e os receba com alegria." na tampa.
- Pai, o que é aquela coisa de madeira?
- Aquilo é um caixão, Jake. É ali que o vovô está.
- Por que?
- Porque é onde as pessoas que estão do mesmo jeito que o vovô ficam. Depois fecham o caixão e colocam naquele buraco no chão.
Explicar essas coisas fez Tom perceber que nunca mais veria o seu pai, que agora tudo que possuía sobre ele eram lembranças.
- Por que?
- Para que ele possa dormir para sempre, já que ele não vai acordar.
- Mas já tentaram jogar água nele?
- Já, filho.
- E dar tapas na cara dele?
- Já.
- Gritaram no ouvido dele?
- Gritaram.
Eles seguiram até o caixão em silêncio. Quando chegaram lá, Tom colocou Jake no colo, para que ele pudesse ver dentro do caixão.
- Oi, vovô.
- Jake, ele não vai...
- Eu sei, papai, ele está dormindo. Mas eu queria dizer oi para ele antes que colocassem ele naquele buraco.
- Pela última vez?
- É.
- Então não quer aproveitar e falar algo pra ele?
- Quero.
- Você quer que eu saia?
- Não, papai. Pode ficar aqui comigo?
- Claro, filho. Não vou te deixar.
Jake deslizou sua pequena mão para dentro da mão do pai e a apertou com força. Ficou calado por um tempo, apenas olhando para o rosto do avô. Tom começou a lembrar de todos os momentos em que viu os dois juntos. Eles estavam sempre sorrindo, brincando, se divertindo. Eles eram felizes juntos.
- Vovô, não sei porque você decidiu ir embora. Eu gostava muito do senhor, você era o melhor avô do mundo. Eu vou sentir falta de todas as vezes que brincamos de bola juntos, que você corria atrás de mim pela casa, tentando me fazer cócegas, de como você nunca me comprava presentes caros, mas que eram os melhores mesmo assim, de como você me protegia sempre que eu tinha medo de algo. Eu sei que o papai pode me proteger, mas vou sentir falta mesmo assim. Se você decidiu ir embora por algo que eu fiz, me desculpe, eu não quis te magoar. Queria muito que você voltasse, vovô, mas o papai me disse que isso é impossível.
Tom estava envolto em lembranças de Jake e Thomas juntos, mas foi tirado dos seus devaneios pelo silêncio. Todos haviam se calado para prestar atenção no que Jake dizia. Jake estava chorando e sua voz tremia.
- Se você decidir voltar, eu vou ficar muito feliz, vovô. Mas se você não voltar, quero que saiba que eu nunca vou esquecer de você e que vou amar o senhor para sempre.
Tom, e todos os presentes no funeral, estavam chorando.
- Eu te amo, vovô.
Jake colocou a mão no seu bolso e retirou algo que Tom não reconheceu a princípio, mas depois de algum esforço lembrou do aniversário de 1 ano do filho, quando Thomas o presenteou com o primeiro carrinho que ele havia construído quando era criança. Aquele carrinho foi o primeiro de uma coleção de mais de cem carrinhos que Thomas construiu ao longo dos anos. Era o mais valioso de todos. Jake o depositou sobre o peito do avô.
- Pai, pode colocar as mâos dele em cima do carrinho?
Jake lutava para não chorar mais.
- Claro, filho.
Ele fez o que o filho havia pedido.
- Quer falar mais alguma coisa?
- Não... posso só dar um beijo nele?
- Claro.
Tom segurou Jake para que ele pudesse beijar o avô dentro do caixão.
- Tchau, vovô.
- Tchau, pai. Vou sentir muito sua falta.
Quando Tom virou para se retirar, percebeu que todos os presentes haviam formado uma fila atrás dele.
- Tom, eu sinto muito. Jake, vai ficar tudo bem. - disse Ed, o primeiro da fila um velho amigo de Thomas.
Jake não respondeu, apenas olhava para baixo. Ed deu um beijo na testa do garoto e se retirou com lágrimas nos olhos. O processo se repetiu até que todos os presentes haviam cumprimentado Tom e Jake. Eles ficaram em silêncio durante um tempo, lembrando dos seus momentos com Thomas. Alguns minutos depois o padre iniciou a cerimônia, e então todos puderam finalmente se despedir do velho e querido Thomas.

Quando a cerimônia havia terminado, Tom e Jake caminhavam para o carro de mãos dadas e Tom percebeu que Jake apertava sua mão com força.
- Tudo bem, filho?
Jake afirmou com a cabeça, mas visivelmente se segurava para não chorar.
- Você quer chorar?
Então Jake abraçou o pai com força e começou a chorar. Um choro sincero de dor e saudade. Tom não conseguiu segurar, abraçou Jake e também derramou algumas lágrimas.
- Eu vou sentir muita falta dele, papai, eu o amava muito.
Jake estava chorando como nunca havia chorado na vida.
- Eu sei, filho, eu também. Mas nós precisamos continuar nossas vidas. Teremos sempre lembranças boas do vovô conosco, mas precisamos seguir em frente.
- E como faremos isso?
- Sendo fortes, filho. Por mim, por você, e pelo vovô. Seja forte.
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Vai em paz, vô. Você vai deixar saudades.

Ps.: Esse era meu avô que eu adorava e que morava longe pra cacete: http://www.patosemcena.com.br/index.asp?Codigo=20111011114923

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Diante dos olhos

Tu-dum.

Mil novecentos e oitenta e quatro. Eu tenho seis anos. Katherine está no balanço, com uma amiguinha. Elas conversam e sorriem. À medida que o balanço faz seu trabalho, os cabelos dourados dela voam numa dança hipnotizante que me faz esquecer do mundo ao meu redor. O sorriso dela me faz querer ir lá dizer o quanto a acho linda, mas eu nunca faria isso. Ela está fora do meu alcance. Fico apenas a observá-la. Sua amiga então percebe que estou olhando e fala para ela. Ela olha para mim e sorri. Eu desvio o olhar e meu rosto fica quente.

Tu-dum.

Mil novecentos e oitenta e seis. Eu tenho oito anos. Meus irmãos brincam no quintal, enquanto eu me apronto para ir a um aniversário. Eu os ouço rir e chutar a bola. Tenho dificuldades para amarrar o cadarço, mas depois de algum esforço consigo. Me olho no espelho. É o aniversário da Katherine. Viramos amigos, mas ela não sabe que gosto dela. Planejo contar hoje. Ouço meu irmão Terry gritar "a bola está indo para a rua" e alguns segundos depois um barulho de freios e um grito. Terry foi atropelado. Morreu na hora. Perdi o aniversário da Katherine. A bola que meu irmão brincava estourou.

Tu-dum.

Mil novecentos e oitenta e seis. Eu tenho oito anos. Estou no funeral do meu irmão. Como se fosse um filme, começa a chover. O caixão começa a ser colocado na cova e tudo que consigo pensar é que ele não deve estar conseguindo respirar ali dentro.

Tu-dum.

Mil novecentos e oitenta e nove. Eu tenho onze anos. Estou sentado na minha escrivaninha, desenhando. Algo bate na janela e eu me assusto. Olho para a rua e vejo Travis, um amigo da escola. Ele faz sinal para eu ir lá fora. Saio e ele me diz que Katherine está me esperando no parque. Ela está sentada no balanço, o mesmo balanço de cinco anos antes. Quando me aproximo, ela levanta e sorri. O sorriso dela tem o mesmo efeito. Quando pergunto o que aconteceu, ela me diz que Travis havia contado que eu gosto dela, e então ela me dá um beijo. Foi o meu primeiro beijo. Sinto um arrepio percorrer minha espinha. É meio nojento.

Tu-dum.

Mil novecentos e noventa dois. Eu tenho quatorze anos. Katherine e eu estamos brigando. Gritamos um com o outro e depois de um tempo eu já nem lembro mais o motivo da briga. Ela me pergunta porque é tão importante para mim estar com ela e eu digo que é porque eu a amo. É a primeira vez que digo isso, embora já soubesse há muito tempo. Ela pára. Meu coração também pára. Então ela me abraça e diz que também me ama, e que se eu respondesse qualquer outra coisa, nunca mais a veria na vida. Fizemos amor pela primeira vez naquela noite. Foi bem bagunçado.

Tu-dum.

Mil novecentos e noventa e cinco. Eu tenho dezessete anos. Estou em casa, quando a campanhia toca. Corro para abrir. O carteiro está na porta, com as correspondências na mão. Assino o recibo e as pego. No meio delas, vejo o símbolo da universidade que estou tentando entrar. Deixo os outros envelopes cair. Abro o comunicado e as palavras "não foi aceito" pulam na frente dos meus olhos. Ótimo. Não queria entrar.

Tu-dum.

Mil novecentos e noventa e nove. Eu tenho vinte e um anos. Estou estudando arte na universidade que eu queria, e Katherine estuda economia em outro estado. Nos falamos todos os dias e nos vemos nas férias. Apesar da distância, consigo manter uma relação saudável com ela. No próximo ano me formarei e então pedirei a mão dela em casamento. Começo a procurar alianças. Espero que ela não me rejeite.

Tu-dum.

Dois mil. Eu tenho vinte e dois anos. Estou na casa dos meus pais, recém-formado. Saio para dar uma volta com Katherine e a levo ao playground. Peço para que ela se sente no balanço, dou a volta e começo a empurrá-lo. Ela fica calada por um tempo e então pergunta o porquê daquilo. Eu a abraço, já com a caixa da aliança aberta na mão e sussurro no ouvido dela as palavras "Katherine, quer casar comigo?". Ela simplesmente desliza o dedo para dentro da aliança, vira e me beija. O "sim" não precisa ser dito. Vou me casar com a mulher da minha vida.

Tu-dum.

Dois mil e um. Eu tenho vinte e três anos. Há cinco horas recebi uma ligação dizendo que Katherine havia se envolvido num acidente de carro. Estou na sala de espera do hospital. Os médicos acham que ela não vai sobreviver. Depois de mais três horas de espera, o cirurgião finalmente sai da sala e diz que ela não resistiu aos ferimentos. Tudo que consigo pensar é que o carro ainda estava sem seguro.

Tu-dum.

Dois mil e cinco. Eu tenho vinte e sete anos. Estou sentado na frente do meu médico, e ele me diz que eu preciso parar de fumar. Desde a morte da Katherine venho fumando dois maços de cigarro por dia, e não acho que devia parar. Acendo um cigarro assim que saio do consultório. O sol está bonito hoje.

Tu-dum.

Dois mil e oito. Eu tenho trinta anos. Meu médico me diz que estou com câncer no pulmão. Preciso parar de fumar imediatamente e começarei a quimioterapia em duas semanas. Se tudo der certo, estarei curado em um ano. Saio do consultório e acendo um cigarro. Preciso sacar dinheiro.

Tu-dum.

Dois mil e nove. Eu tenho trinta e um anos. Dr. Carter diz que o câncer está avançando. Se eu não cooperar, durarei no máximo três anos. As tosses são constantes agora. Saio do consultório, pego a carteira de cigarro no bolso do paletó e jogo no lixo. No caminho para casa compro outra e já estou no terceiro quando chego à minha porta.

Tu-dum.

Dois mil e dez. Eu tenho trinta e dois anos. Dr. Carter diz que tenho, no máximo, um ano de vida. Passo a maior parte do tempo no hospital agora, e sonho com Katherine e Terry todas as noites.

Tu-dum.

Dois mil e onze. Eu tenho trinta e três anos. Os enfermeiros estão tentando me reanimar, mas vejo minha vida passar diante dos meus olhos. Quando termina, a realidade do que aconteceu me atinge como um tiro. A morte do Terry. A morte da Katherine. A não aceitação da minha própria condição. Tudo desaba sobre mim. Escuto um dos enfermeiros dizer que lágrimas saem dos meus olhos. Não sinto dor alguma. Sinto como se fosse um espectador observando tudo isso. Tudo começa a ficar branco. Vejo Katherine e Terry. Eles estão sorrindo. Eles estão me esperando. Estou indo para casa.

Estou indo para casa.
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Pra ser sincero... não gostei muito dessa. u.u
Mas de qualquer maneira, tá aí. Espero estar errado. =p

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Vida Súbita

06 de abril de 2011.

Este dia vai ficar marcado na minha mente como o ferro quente marca o gado.

Hoje eu conheci a pessoa mais importante da minha vida.

Meu filho.

E para ser sincero, ainda não sei ao certo o que estou sentindo. Só sei que é algo sem comparação. A sensação que tive quando o vi pela primeira vez, quando ouvi seu choro pela primeira vez, quando toquei a mãozinha dele e ele segurou meu dedo com toda força, quando ele não parava de chorar de jeito nenhum e eu consegui acalmá-lo segurando-o no colo... é indescritível.

Sei que, a partir de agora, a história é outra. Mas quando você vê uma pessoinha que VOCÊ ajudou a fazer olhar pra você e parar de chorar... não existem palavras.

E como se não bastasse todo esse amor que não tem como medir, ele é lindo e não tem cara de joelho.

Eu ainda vou escrever muito, MUITO, sobre essa nova jornada que hoje mamãe e papai começam a percorrer. Desafios a serem superados, provas a serem vencidas, lágrimas a serem derramadas, sorrisos a serem admirados... muita coisa vai acontecer daqui pra frente.

Mas o que eu queria deixar registrado aqui, neste dia, é o seguinte:

Tranquem suas filhas.


Porque Eduardo do Valle de Brito Amorim chegou.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Tirando a poeira

Depois de muito algum tempo sem postar nada, tô passando aqui só pra tirar a poeira. 

Hoje eu estava pensando nos textos que já escrevi e lembrei que tem um que nunca postei aqui.

Foi a primeira história que escrevi.

Pra situar vocês, em 2007 eu jogava rpg com um grupo mestrado por Thiago Lee (sim, o que tá na Bélgica =p), e ele ia começar uma campanha nova. Quando começamos a fazer os personagens, ele pediu pra que fizéssemos backgrounds caprichados. Eu tinha acabado de ler A Torre Negra, então ainda tava naquela fase meio "caralho acabei de ler um livro foda e só consigo pensar nele". Quando idealizei meu personagem, obviamente eu fiz um pistoleiro cópia cagada e cuspida baseado em Roland.

Seu é Steven McCain, e este é o começo da sua jornada...
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- Merda! - bravejou Henry.
- Essa é a terceira vez seguida, Steven. Admita que isso é estranho. - disse Clint, empunhando o taco como se fosse uma espada.
- Vocês sabem que coisas estranhas acontecem. Eu sou um pistoleiro, vocês acham que um pistoleiro iria trapacear? - Respondeu Steven, meio na defensiva.
- Steven, veja bem. Veja com esses olhos de pistoleiro que você tanto preza. - Disse Henry, transformando sua mão num borrão que ia em direção ao coldre na sua coxa esquerda.
  De repente, como que por encanto, Henry estava encarando 2 canos de revólver, um em cada olho. Antes mesmo que ele pudesse tocar a coronha do seu revólver, Steven já havia sacado os seus e, se quisesse, a cabeça de Henry já não existiria mais.
- Ei, ei, tenhamos calma. - disse Clint, afastando os dois - Não queremos causar confusão no Saloon da nossa querida Helena por uma simples partida de bilhar, concordam?
  Steven McCain, filho de Rowan McCain e uma puta qualquer, ponderou por um momento. Apesar de Henry ser seu amigo de infância, ele nunca gostou do seu temperamento explosivo e sempre soube que isso um dia o levaria à clareira no fim do
caminho. Mas Clint estava certo, não valia à pena espalhar o cérebro do seu amigo por uma partida de sinuca.
  Ele colocou os revólveres de volta aos coldres.
- Tudo bem. - disse ele, tentando controlar o impulso de acertar as contas com o amigo, de resolver de uma vez por todas tudo que eles haviam deixado em aberto - Mas que fique claro que não estou trapaceando.
- C-certo. - gaguejou Henry, não por medo, mas por espanto com a velocidade de Steven.
- Helena, estamos de saída, pendura tudo na minha conta, amanhã trarei o pagamento sem falta. - disse Clint, dirigindo-se às portas de vai-e-vem.
- Certo, eu agradeço. - respondeu Helena, puxando o bloquinho de notas - Longos dias e belas noites.
  Clint Richards, Henry Johnson e Steven McCain saíram do Saloon, se dirigiram aos seus respectivos cavalos e montaram.
Steven ainda pensando no que havia acontecido no passado, quando eles ainda estavam começando a criar barba e Henry Johnson, seu mais antigo amigo, havia se engraçado com sua namorada. Apesar de ele ter visto os dois juntos, sempre teve o pressentimento de que havia alguma coisa errada nessa história.
- E então, Steven, está na hora? - perguntou Clint, sem conseguir disfarçar a ansiedade na voz.
- Se não estiver, quero que um raio parta a puta da minha mãe no meio. - Respondeu Steven, atiçando Dash com as esporas e dando um sorriso do tipo que faria o mais bravo dos Sherokees pensar duas vezes antes de levantar o tacape contra ele.

  Steven e seus companheiros tinham uma missão. A missão consistia em emboscar o comboio que, segundo informações, passaria a oeste de Canetown e, com a ajuda de alguns pistoleiros da confederação, descobrir se o comboio apoiava Lars, o fora-da-lei, e o que eles transportavam.
  Tudo correu bem, eles ficaram de tocaia durante 20 minutos, e quando o comboio, com mais ou menos 25 cavaleiros, passou por eles, eles entraram em ação. O problema foi quando a coisa começou a dar errado e as mortes começaram a acontecer.

  Segundo as informações que eles receberam, o comboio estava programado para passar por Canetown às 15:00 horas. Eles chegaram no local da emboscada às 14:00, desmontaram e começaram a procurar um local apropriado para ficar de tocaia.
- Clint! Steven! Tem umas pedras aqui grandes o suficiente para escondermos os cavalos e ficar de tocaia. - gritou Henry.
  Depois que eles esconderam os cavalos e se sentaram, Steven acendeu um cigarro para tentar aliviar a tensão que sentia. Não importava quantas vezes já tivesse participado de uma emboscada, sempre ficava meio tenso antes de uma. E o silêncio sempre
reinava entre eles nesses momentos.
  O silêncio foi quebrado apenas quando faltavam uns 10 minutos para as 15:00 horas, quando Clint disse aos pistoleiros extras que eles não precisavam fazer nada, a não ser que algum dos 3 se ferisse.
  Às 15:00, eles viram o comboio despontar ao norte, e pelos cálculos de Clint, demorariam aproximadamente 30 minutos até que se perdessem de vista ao sul. Vinte minutos depois, eles estavam saindo da tocaia, agradecendo ao Homem Jesus pela camada espessa de poeira na estrada. Foram em direção ao comboio com velocidade moderada, e quando chegaram com os retardatários do grupo, começaram a emparelhar e enterrar suas facas nos corações dos cavaleiros, antes que estes pudessem saber que havia alguém emboscando eles. Quando restavam uns 15, Steven sacou seus revólveres, os revólveres que ganhou de seu pai, e disse:
- Está na hora da matança.

  O líder do comboio, Juan, não percebeu que estava sendo emboscado até escutar o trovão de revólveres disparando e o grito de guerra dos pistoleiros:
- Comigo, pistoleiros, comigo! Não façam prisioneiros! Acabem com todos eles e deixem o líder para mim!
  Quando ele deu meia volta para ver o que estava acontecendo, seus homens já haviam sido reduzidos à 8, e 3 pistoleiros tratavam de eliminar o resto com estranha rapidez e facilidade, sempre seguindo as ordens do que parecia ser seu líder.
- Clint, às 9 horas, pronto para disparar! - gritava o homem que estava ao meio, e então o da sua direita eliminava o seu oponente às 9 horas.
- Henry, 11 horas, sacando uma espingarda! - e o da esquerda enfiava uma bala na testa do inimigo às 11 horas.
  Os outros, pareciam meramente um apoio para o caso de os 3, por alguma razão, não dessem conta da missão sozinhos, pois estavam todos atrás, assistindo.
  "Isso não pode estar acontecendo, pistoleiros? E como aquele cara do meio tem tanta visão do campo de batalha?" pensou Juan, e antes que pudesse pensar em qualquer outra coisa, estava cercado, e todos os seus companheiros, mortos.
- E então, você vai começar a falar ou vou ter que enfiar umas balas nas suas pernas? - disse Steven, apontando um dos revólveres para a coxa de Juan.
- Calma, calma, não podemos negociar? Me chamo Juan Cortez e lidero esse comboio que transporta arroz para Ricetown. - respondeu Juan, tentando parecer um vaqueiro normal.
- Salve a ladainha, garoto-siesta. Sabemos que você trabalha para Lars e queremos que nos diga o que está transportando. E é melhor começar a falar logo, pois meu revólver quer ver mais sangue. - disse Henry, e Steven percebeu que o temperamento explosivo dele poderia pôr tudo a perder.
- Eu não sei do que estão falando, vejam. - disse Juan, e começou a cavalgar para uma das carroças. Quando chegou nela, puxou a coberta e disse - Viram? É só arroz!
  Steven se adiantou para conferir, mas Clint tomou a frente. Quando deu uma boa examinada na carroça, falou em voz alta:
- É... é só arroz mesmo. Parece que fizemos toda essa chacina por causa de arroz.
- Puta que pariu! E a informação que recebemos? - bravejou Henry.
- Calma, deve haver uma explicação. Clint, eu vou dar uma olhada nessa carroça. - disse Steven, descendo do cavalo e indo para a carroça. Ele não pôde deixar de perceber o olhar assustado que inundou o rosto de Juan. Por precaução, resolveu usar o poder que já salvou sua vida tantas vezes nessas terras onde a lei é mantida à base de chumbo.

- Steven, venha cá! - gritou Rowan, com seu bom-humor característico.
  Steven conhecia esse tom de voz. Seu pai havia preparado alguma surpresa. Ele desatou a correr em direção ao jardim e no meio do caminho se lembrou que era seu aniversário. Hoje ele completava sete anos. Hoje ele estava se tornando um aprendiz de pistoleiro.
  Quando chegou ao jardim, encontrou o pai em pé ao lado de uma égua. Ela estava grávida.
- Sim, pai. - disse, meio sem entender.
- Aqui está seu presente de sete anos. - disse Rowan, sorrindo de orelha a orelha e apontando para a égua.
- Uma égua grávida? Pensei que pistoleiros montassem cavalos, pai. - disse Steven, sufocando uma risadinha.
- Não, criança. O presente é o que ela carrega na barriga. Hoje você se torna um aprendiz de pistoleiro, então vai ganhar um aprendiz de cavalo. - disse Rowan, sorrindo tanto que sua cabeça quase se partiu em duas.
  Steven desatou a rir com a piada feita pelo pai, e correu para abraçá-lo.
- Feliz aniversário, filho. - disse Rowan, com a voz suave.
- Obrigado, pai.
- Ah, ele não tem nome ainda, e você vai escolher. - disse Rowan, dando uma piscadela.
- Já havia escolhido um. Será Dash. - disse Steven, sorrindo.
- Vou no celeiro buscar a cela e as rédeas para te ensinar a colocar. - disse Rowan, e começou a se dirigir para os fundos da casa.
  Steven ficou olhando o pai se distanciar, pensando que não podia haver melhor pai no mundo. Quando Rowan atingiu a porta do celeiro, Steven escutou um disparo de revólver, e de repente viu seu pai tombar no chão.
- PAI!!!! - gritou, e começou a correr em direção ao celeiro. Quando alcançou o pai, viu que o rosto dele estava totalmente destruído, e, instintivamente, olhou em volta, mas não encontrou ninguém. Rowan começou a levantar a mão para o rosto de Steven, mas antes que pudesse tocar o rosto do filho, ele encontrou a clareira no fim do caminho.

- Vou no celeiro buscar a cela e as rédeas para te ensinar a colocar. - disse Rowan, e começou a se dirigir para os fundos da casa.
  Steven percebeu, confuso, que seu pai estava na sua frente, começando a caminhar para os fundos da casa. Agindo por instinto, ele foi até o cavalo do pai, puxou um dos revólveres de Rowan, e seguiu o pai até o celeiro. Quando chegou nos fundos da casa, ele viu. Havia alguém de tocaia no arbusto do lado esquerdo do celeiro. Quando o desconhecido estendeu o revolver para matar seu pai, ele apontou e disparou.
  Rowan ouviu o disparo e se jogou no chão. Passado o susto, ele olhou para trás e viu o filho, revólver em punho, ainda fumegando. Ele olhou para a direção que Steven estava olhando e viu. Havia alguém de tocaia no arbusto ao lado do celeiro esperando para assassiná-lo. Ele se levantou e correu em direção ao filho, tirando a arma de sua mão. Depois foi em direção ao arbusto e examinou o corpo que estava lá, com um rombo no lugar do coração. Retirou o lenço do rosto e viu que não era nenhum conhecido. Então ele retornou para o lado do filho, que ainda encarava o cadáver, e disse, abraçando o garoto:
- Steven, meu filho, você acabou de salvar a vida do seu pai! Pelo bom Deus e o Homem Jesus! Como você sabia?
  Mas Steven não era nenhum idiota, ele já havia entendido.
  Ele podia prever o futuro.

  Ele estava caminhando para a carroça. Ele estava chegando na carroça. Ele estava olhando para dentro da carroça. Havia sacos de arroz lá dentro. Mas também havia alguma coisa embaixo. Sim... havia mais sacos de arroz, só que meio disformes. Ele estava estranhando esses sacos. Ele estava pedindo para que Juan retirasse os sacos de arros de cima. Ele estava se afastando para que Juan pudesse fazer o trabalho que lhe havia sido atribuído. Ele estava vendo Juan Cortez suar em bicas. Ele estava vendo Juan retirar os sacos de arroz. Ele estava pedindo para Juan retirar um dos sacos do fundo e abrir. Ele estava vendo Juan retirar o saco e puxar uma faca para abrí-lo. Ele estava vendo Juan ofegar. Ele estava vendo Juan cortar o saco de arroz com sua faca. Ele estava pedindo para Juan retirar o conteúdo. Ele estava vendo Juan puxar uma arma que ele nunca havia visto em todos esses anos de emboscada. Ele estava sacando seus dois revólveres. Ele estava apontando para Juan. Ele estava gritando para Juan abaixar a arma. Ele estava vendo que Juan sorria e olhava para sul. Ele estava vendo o olhar de terror dos seus companheiros. Ele estava olhando para sul. Ele estava vendo um grupo de aproximadamente 30 cavaleiros vir à todo vapor. Ele estava ouvindo Juan dizer "Bem na hora". Eles estavam sendo emboscados.

  Steven correu para montar em Dash, colocando os revólveres de volta aos coldres.
- Henry! Clint! Todos os pistoleiros! Nós seremos emboscados! Há um grupo de 30 pistoleiros vindo do sul para dar suporte ao comboio de Juan! Eles estão transportando armas para Lars, e são armas que nunca vi na vida!
  Ele montou, deu meia volta e encarou todos os pistoleiros. Henry já estava rasgando um dos sacos de arroz que continham as armas e exclamando:
- Maldito seja, latino de uma figa! Fique sabendo que quando nós acabarmos com isso você vai ser interrogado e enforcado no meio da cidade!
  Steven apenas ignorou o amigo e voltou-se aos outros:
- A prioridade é capturar Juan e levar essas armas de volta à confederação! Mas não vamos conseguir sem derrotar aqueles cavaleiros! Clint cuide para que Juan não fuja! Esperem o meu sinal!
  Quando o grupo de pistoleiros estava a mais ou menos 200 metros ele gritou:
- Agora, pistoleiros, acabem com eles! Amaldiçoado seja aquele que não explodir uma cabeça aqui!
  Eles começaram a cavalgar em direção aos inimigos, deixando Clint e Juan para trás. Imediatamente ele começou a usar seu poder, embora já estivesse exausto. Se ele não usasse, provavelmente todos acabariam mortos. Antes exausto que morto.
  Ele deu instruções a todos e começou a disparar.
  No meio da batalha, Steven percebeu que Clint estava ao seu lado. Ainda disparando, ele gritou:
- Em nome do seu pai, Clint, o quê diabos você está fazendo aqui?
- Vi que estávamos com menos homens e não podia ficar parado. Se Juan fugir, será uma pena, mas pelo menos estaremos vivos.
  Steven viu que o amigo estava certo e continuou disparando e recarregando sempre que precisava. Quando ele viu que podiam vencer, o líder dos pistoleiros gritou:
- Retirada! Retirada! Cavalguem como o vento se quiserem ver o anoitecer de hoje!
  Todos os pistoleiros inimigos começaram a bater em retirada, e então Steven gritou:
- Vencemos! Não os sigam, pode ser uma armadilha! Vamos voltar à cidade e preparar nossas defesas em caso de invasão!
  Quando ele deu meia-volta, viu que Juan havia fugido. Mas havia deixado as carroças para trás.
- Clint. Henry. Vamos levar essas armas de volta à cidade e examiná-las. Se tivermos munição para elas, podemos até usá-las para nos proteger de uma possível invasão das tropas de Lars.
  Começaram a cavalgar de volta às carroças quando percebeu que tiveram algumas baixas. Percebeu que não podia deixar os corpos dos companheiros para trás e mandou um dos sobreviventes ir até a confederação requisitar alguns cavaleiros e carroças para transportar os mortos.

  De volta à cidade, Steven conversava com Clint e Henry no prédio da confederação.
- Com certeza Lars vai mandar tropas virem atrás dessas armas. Eu nunca vi nada parecido.
- Steven, você precisa dormir. Você usou a clarividência hoje mais vezes do que na semana passada inteira. - disse Clint.
- Temos coisas mais importantes para nos preocupar. Dependendo de onde Lars esteja montando sua base, eles podem atacar ainda esta noite.
- Clint está certo, Steven. Vá descansar e deixe que nós cuidamos do resto...
  Mas ele parou quando viu o olhar no rosto de Steven.
- A clarividência! É isso! Eu posso tentar usá-la para ver quando Lars vai atacar.
- Steven, nós nem sabemos ainda se ele vai atacar. - era Clint.
- Você, no lugar dele, deixaria armas assim para trás?
- Bem colocado. - e isso encerrou o assunto.
- Mas você mesmo disse que só consegue ver no máximo trinta segundos no futuro, Steven. - disse Henry.
- Não custa nada tentar. - disse ele, sentando-se numa cadeira.
- Não vamos conseguir convencê-lo a desistir disso, não é? - perguntou Henry.
- Se já sabe a resposta, pra quê perguntou? - disse Steven.
  Ele fechou os olhos e começou a se concentrar. E de repente tudo ficou preto.

  Ele estava na frente de casa enrolando um cigarro quando Clint chegou correndo.
- Steven, aconteceu uma coisa horrível! Venha comigo que no caminho te explico.
  Ele simplesmente largou o cigarro e correu para Dash, montando com incrível facilidade. Quando alcançou Clint, este já estava montado.
- Pelo amor de seu pai, me conte logo o que aconteceu! - disse Steven, emparelhando com ele.
- Seu pai viu Henry e Linda juntos, Steven! E agora ele quer acabar com Henry!
- Henry e Linda, juntos?! Você tem certeza? - perguntou Steven, incrédulo.
- Juro pelo meu pai, Steven. Mas agora temos que correr.
  E eles correram como o vento.
  Quando chegaram lá, Rowan estava com um dos seus revólveres apontados para a cabeça de Henry.
- Amizade não significa nada para você, seu imundo? Você conhece meu filho desde que ainda usavam fraldas! Os dois estão juntos aprendendo o caminho do pistoleiro! Como você pôde fazer uma coisa dessas?
- Pai! Calma, deixe que eu mesmo resolvo isso. - Disse Steven, desmontando e correndo na direção dos dois.
  Quando os alcançou, sem dizer nada, desferiu um soco no queixo de Henry que o fez tombar. Logo em seguida subiu no amigo e começou a socá-lo com selvageria.
- Nunca mais olhe para mim, seu traidor de uma figa! Você esqueceu o rosto de seu pai!
  Logo depois, Clint estava retirando ele de cima de Henry e tentando conter sua fúria.
- Steven, você não entende, eu não fiz nada. Ela que tentou me roubar um beijo bem na hora que seu pai estava saindo do Saloon. - disse Henry, em meio às lágrimas.
- Não me dirija a palavra, seu porco imundo! Nunca mais me dirija à palavra!
- Filho, vai embora. - disse Rowan, guiando Steven até seu cavalo. - A moça impura já saiu daqui, não agüentou a vergonha.
  Ele montou novamente em Dash, pronto para partir. Mas antes de atiçar o cavalo com as rédeas, ele deu uma última olhada
para trás.
- Nunca, Henry, nunca, eu achei que você poderia me trair assim. - disse.
  Henry nada disse, apenas ficou ali, encarando o amigo, derramando lágrimas que pareciam jamais ter fim.
  Antes de se virar, Steven percebeu. Aquelas lágrimas não eram de vergonha, nem de arrependimento, tampouco de dor. Eram lágrimas de um inocente.

  Steven acordou zonzo, ainda pensando no sonho que acabara de ter. Agora, vendo tudo aquilo pela segunda vez, ele teve certeza de que havia algo errado naquela situação. Percebeu que já era noite. Levantou-se da cama em que estava, e percebeu que estava num dos dormitórios da confederação. Encaminhou-se até a porta e escutou vozes. Vozes que gritavam.
- Rápido, pegue essas armas, seu porco molenga! As tropas de Lars já estão a chegando na cidade!
  Totalmente acordado pelo que havia acabado de ouvir, ele percebeu tiros e explosões um pouco distantes. Voltou correndo para a cama, pegou seus pertences, checou se haviam balas o suficiente, se arrumou rapidamente e saiu do dormitório pronto para a batalha. Quando atingiu o corredor, viu Kurt e Colin, 2 membros da confederação correndo em direção ao depósito de armas.
- Preciso de munição. - disse.
- Pelo amor de seu pai, Steven, pensei que ia dormir o dia todo. Venha conosco. - disse Kurt.
  Eles foram até o depósito, e chegando lá, Steven perguntou:
- Vocês viram Henry e Clint?
- Na linha de frente, estourando cabeças. - respondeu Colin.
- E meu cavalo? - perguntou enquanto guardava as balas na cartucheira.
- Amarrado na entrada do prédio, apenas esperando que você acordasse. - disse Colin novamente.
- Eu agradeço, que o bom Homem Jesus olhe por todos nós. - disse, se retirando.
- Nós agradecemos. - disseram os dois, em uníssono.
  Steven correu em direção à entrada do prédio e viu Dash preparado para a batalha, aguardando sua chegada. Ele montou, e começou a atiçar o cavalo com suas esporas, dizendo:
- Vamos lá, Dash! Mostre-me agora do que você é capaz!
  Dash começou a correr mais rápido que nunca, relinchando em resposta.

  Quando ele chegou à linha de frente, utilizou seu poder para encontrar os amigos e viu que estava totalmente descansado.
Encontrou os dois disparando feito loucos do lado oeste da batalha, e emparelhou com eles, sacando seus revólveres.
- Antes tarde do que nunca, hã? - disse Clint, sorrindo.
- Coma isso, seu insolente! Ainda está para chegar o dia em que alguém vai me levar á clareira! - Gritou Henry, enquanto dava fim à vida de um dos soldados de Lars - Steven! Achei que ia dormir até a batalha acabar.
- Não perderia isso por nada, amigo. Por nada. - disse ele, lembrando do sonho e das lágrimas de inocência de Henry.
  Passados alguns minutos, o líder da tropa de Lars gritou.
- Retirada! Bater em retirada! Lars está aqui e quer cuidar disso pessoalmente!
  Os soldados de Lars começaram a cavalgar de volta ao sul, onde havia uma grande concentração das forças.
- Homens! Vamos voltar à cidade! Parece que Lars quer negociar! - gritou Jake Skye, o comandante da tropa da confederação.
- Skye, nós três podemos resolver essa. - disse Clint.
- Steven, você concorda? - perguntou Skye.
- Claro que sim, Skye. Henry, Clint, prontos? - disse Steven, vendo um cavaleiro solitário cavalgar em direção a eles.
Provavelmente Lars.
- Eu nasci pronto. - disse Henry.
- Henry, você nasceu chorando. - disse Clint.
  Eles começaram a cavalgar em direção a Lars Howard, o fora-da-lei.

- Vocês são bons, principalmente você aí no meio, pistoleiro. - disse Lars, abrindo um sorriso que parecia maior ainda devido à cicatriz que ele possuía na bochecha esquerda.
- Pode cortar a ladainha, seu verme. - disse Henry - Não vamos nos render.
- E quem disse que eu quero que vocês se rendam? - respondeu Lars - Quero que não desperdicem seu talento e se juntem a mim.
Sua cidade será poupada e vocês terão acesso àquelas armas que capturaram mais cedo.
- Você está louco? Não esquecemos os rostos de nossos pais. - disse Henry - Se essa é sua intenção, é melhor continuarmos com a batalha e cortar a conversa mole.
  Steven percebeu que Clint, o mais diplomático dos três, estava calado.
- Tem certeza? Sua força seria muito bem utilizada por mim, e você teria as regalias que quisesse.
- Não sou nenhum fora da lei. Aqui nessa cidade não tem nenhum fora da lei. Certo, caras? - disse Henry.
- Não tenho tanta certeza. Richards? - disse Lars, olhando para Clint.
  Steven só teve tempo de ouvir o trovão do revólver de Clint, e logo em seguida viu o corpo inerte de Henry tombar do cavalo.

- E quem disse que eu quero que vocês se rendam? - respondeu Lars - Quero que não desperdicem seu talento e se juntem a mim.
Sua cidade será poupada e vocês terão acesso àquelas armas que capturaram mais cedo.
- Henry, é uma cilada! Clint é seguidor de Lars, ele nos traiu! - disse Steven, sacando os revólveres.
- O quê? Você ficou louco, Steven? - respondeu Henry.
- Eu vi, ele vai nos trair e te matar! - disse Steven, alarmado.
- Ele nunca nos trairia, Steven. Eu confio plenamente nele. - disse Henry, se recusando a acreditar no que ouvia.
- Eu confiava plenamente em você e você me traiu! - disse Steven, com lágrimas nos olhos.
  Essas palavras afetaram profundamente Henry, pois ele ficou olhando para Steven, sem dizer nada, chocado.
- Infelizmente, Henry, Steven está certo.
  Henry Johnson não teve tempo de se virar. A bala atingiu seu coração antes mesmo que ele pudesse processar o que havia acabado de ouvir.
- NÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃO! - gritou Steven, e disparou contra Clint e Lars ao mesmo tempo, fazendo os dois tombarem dos cavalos.
  Ele desmontou e correu até Henry, que ofegava. Tomou o amigo nos braços e disse:
- Não, Henry, não! Você não pode morrer, ainda não acertamos aquela história.
- Steven, eu já te disse, eu não fiz nada. Foi tudo uma armação. - disse Henry, com dificuldade.
- Ele está falando a verdade, Steven! - era a voz de Clint, meio falha - Foi tudo armação. E sabe quem armou? Eu!
- Clint... nós sempre confiamos em você. - disse Henry - Nós três sempre confiamos uns nos outros. Por quê?
- Meu pai já era seguidor de Lars naquela época! Logo, eu também seria. E eu recebi uma missão. Fazer com que parecesse que
você e Linda estavam tendo um caso, para o pai de Steven te matar, e isso abalaria a confederação, causando um conflito interno na cidade. E o resultado? Isso facilitaria a conquista da cidade pelas tropas de Lars!
  Steven, que havia esquecido o resto do mundo, percebeu que a batalha havia recomeçado. Provavelmente os tiros trocados ali haviam dito para o resto dos combatentes que a negociação havia falhado.
- Clint, seu miserável! Você esqueceu o rosto de seu pai! - gritou Steven.
- Não, Steven, eu me lembrei do rosto dele. Estou fazendo exatamente tudo o que ele queria que eu fizesse. - disse Clint, rindo.
- Henry, espere aqui, eu vou acabar com esta batalha. Depois voltarei para te ajudar. - disse Steven.
- Acho que não tem mais jeito, parceiro. Já era para eu ter encontrado a clareira, mas estou agüentando tempo demais. Vá. Vença essa batalha e acabe com esse traidor. Por mim e pelo seu pai.
- Não quero que você morra sem antes saber se nós acertamos nossas contas. - disse Steven.
- Pode apostar que sim, parceiro.
- Eu agradeço, amigo. - respondeu Steven, chorando.
- Eu que agradeço por ter tido a chance de viver ao seu lado, Steven. - disse Henry, com os olhos pesando.
- Ah... sobre aquela partida de bilhar, mais cedo... eu não estava trapaceando. - disse Steven, rindo e chorando ao mesmo tempo.
- Sem chance. Quer dizer que você joga tão bem? - perguntou Henry, dando a sua última risada.
- Eu sou filho de Rowan McCain. Estranho seria se eu não jogasse bem.
- É... acho que sim.
  Eles ficaram mais um tempo calados, Henry se preparando para a sua hora e Steven se preparando mentalmente para a batalha que viria a seguir.
- Acho que chegou a hora, parceiro. Se existir um inferno, te vejo lá.
- Claro que existe. Se não, pra onde nós iríamos?
  Mas Henry não respondeu. Henry Johnson, filho de Robert Johnson e Martha Johnson, apenas sorriu e fechou os olhos.
  Ele havia encontrado a clareira no fim do caminho.

  Clint havia fugido.
  Steven, totalmente distraído com o estado de Henry, não percebeu que Clint havia aproveitado a chance para escapar. Lars havia fugido também, deixando seu cavalo para trás.
  A batalha estava intensa, mas a confederação parecia estar agüentando bem, apesar da desvantagem numérica. Ver seu líder ser baleado aparentemente havia abalado os soldados do fora-da-lei.
  Steven montou em Dash e entrou na batalha. Determinado a acabar com aquilo tudo, cada tiro que ele disparava tirava uma vida das tropas de Lars. Depois de algum tempo atirando e recarregando, ele viu. Clint e Lars. Os dois montando Kaiser, o cavalo de Clint. Os dois entrando na cidade.
  Steven soube imediatamente o que eles iriam fazer, mesmo sem usar a clarividência.
  Eles iam tomar Rowan como refém.

  Rowan McCain já havia passado seus revólveres adiante. Não era mais um pistoleiro. Mas ele estava na sede da confederação, ajudando indiretamente na batalha.
  Clint Richards entrou na sala dele, com a camisa suja de sangue na parte da barriga.
- Clint! Meu Deus! Venha aqui, vou cuidar do seu ferimento!
- Não se preocupe, Sr. McCain. Quem precisa de ajuda aqui é você.
  Nessa hora, Rowan percebeu que Lars Howard também estava entrando na sala.
- Não estou entendendo. O que está acontecendo, Clint?
- Coloque suas mãos para cima e fique calado, seu insolente! - ordenou Clint, apontando seu revólver para Rowan.
- Rowan McCain? Pai de Steven? Mas que honra! - disse Lars, rindo, ignorando totalmente o ferimento no ombro - Sua reputação o precede.
- Já passei meus revólveres para meu filho, parceiro. E vejo que você tinha um espião na nossa cidade.
- É, desde Larry, pai de Clint. Ele foi quem deu a informação do comboio de hoje à tarde. Ele foi quem deixou Juan fugir. Ele foi quem deu a idéia de negociar comigo, hoje, no meio da batalha. Era tudo parte do plano para derrotar a filiação da confederação nessa cidade. Esse é meu objetivo, destruir todas as cidades representantes da confederação e governar o continente Oeste.
- Depois que vi aquilo tudo, Clint, já desconfiava que fosse tudo parte de um plano. - Steven estava de pé na porta, apontando suas armas para os dois.
  Mas Clint era rápido, afinal, ele era um pistoleiro. Ele agarrou a camisa de Rowan e o colocou na sua frente, apertando o cano da arma contra a têmpora do refém.
- Clint, largue o meu pai. Se você se render você será julgado justamente no tribunal da cidade.
  Lars estava parado do lado de Clint, completamente impotente.
- Veja bem, Steven, eu posso muito bem matar seu pai e depois morrer pela sua arma. Mas o destino dessa cidade já está traçado. Ela será destruída pelas tropas de Lars.
- Eu não contaria muito com isso, parceiro. Olhe pela janela.
  Clint, que normalmente não acreditaria em uma mentira deslavada dessas, não pôde deixar de tremer quando viu a certeza no rosto de Steven.
- Lars, você poderia olhar pela janela e ver o que está acontecendo lá fora?
  Lars, que estava completamente impotente na situação, não teve outra escolha. Encaminhou-se até a janela e um olhar de espanto inundou seu rosto.
- É impossível... as forças da confederação estão esmagando minhas tropas!!
- O quê? - disse Clint, e cometeu o erro de olhar para trás.
  Era tudo que Steven precisava. Enquanto tinha sua última conversa com Henry, Steven teve tempo de usar sua clarividência. E ela nunca havia sido tão forte. Ele viu que a confederação ganharia esta batalha.
  Ele disparou, acertando a mão de Clint e desarmando o inimigo.
- Eu já sabia disso tudo, Clint. A clarividência me mostrou, a confederação vai vencer essa, e isso vai ser decisivo para derrotar o resto das tropas de Lars. Agora você está desarmado, largue o meu pai. Lars, vá para o lado de Clint.
  Clint Richards viu que estava sem escolha. Soltou Rowan e ficou ali parado, pensando que poderia estar no lado vencedor da batalha.
  Quando Rowan chegou ao lado de Steven, este sorria.
- Isto é por Henry, seu traidor. - disse, e disparou.
  De repente ele sentiu uma dor no seu ombro esquerdo. Havia uma faca enterrada ali. Quando ele olhou, teve tempo de ver Clint puxar Lars para sua frente, e a bala que ele disparou transformou a cabeça de Lars num aglomerado de ossos e sangue.
- Steven! - gritou Rowan, segurando o filho.
  Clint estava fugindo pela janela.
- Estou bem, pai. Pegue as armas e vá atrás de Clint.
  Rowan não discutiu. Pegou as armas e pôs-se a correr para a janela, para seguir Clint. Steven retirou a faca do seu ombro e foi até a mesa do seu pai, para fazer um curativo no ferimento. Mas o que mais o incomodava não era o buraco no seu ombro.
Era o fato de que o assassino do seu amigo, o traidor, o homem que um dia foi seu melhor amigo, estava fugindo.
 
  Rowan entrou novamente na sala.
- Não consegui alcançá-lo, Steven, me desculpe. O cavalo dele estava amarrado muito próximo daqui.
- Não tem problema. E a batalha?
- Acabou. Vencemos. - respondeu Rowan, mas sem sorrir.
- Pai... Clint matou Henry.
- Eu soube. vi o corpo dele sendo trazido de volta para o prédio.
- Ele nunca traiu minha confiança, pai. Todo esse tempo eu o amaldiçoei pelo que ele havia feito, mas ele era inocente. Foi tudo uma armação de Clint. - disse Steven, começando a chorar.
- Vocês acertaram as contas?
- Sim. - respondeu Steven.
- Então está tudo bem, filho. - disse Rowan, abraçando Steven. - Onde quer que ele esteja, tenho certeza de que ele está feliz por ter morrido sem ter nenhuma dívida com você.

- Henry Johnson foi, para mim, o melhor amigo que alguém jamais conseguiria ser. Tivemos nossas desavenças no passado, mas descobrimos que tudo havia sido armado com a finalidade de nos colocar um contra o outro. Eventualmente eu o perdoei, mas sempre fiquei com um pé atrás para ele. Mas ontem à noite, antes dele encontrar a clareira, descobrimos que tudo havia sido armado por Clint Richards, o traidor.
  Era o enterro de Henry. Steven, como foi a última pessoa a ver Henry em vida, estava dando algumas palavras para os presentes.
- Clint Richards, que vendeu sua honra e se aliou a Lars Howard, o fora-da-lei. Clint Richards, filho de Larry Richards, que também é um traidor. Ele será inimigo dessa cidade para sempre, e eu não descansarei até pôr um fim à vida miserável dele.
  Steven pegou a arma de Henry.
- Lembrem-se de Henry Johnson. Lembrem-se de como ele morreu para defender a cidade, a lei, a justiça. Lembrem-se de como ele sempre foi uma boa pessoa, apesar do seu temperamento explosivo. Lembrem-se de Henry Johnson.
  Ele depositou a arma em cima do caixão.
- Adeus, amigo. Nos vemos na clareira.
  A terra começou a ser jogada em cima do caixão.
  Agora Henry Johnson era uma lembrança.

- Pai, estou indo. - disse Steven, colocando sua mochila nas costas.
- Não vou conseguir convencê-lo do contrário, não é?
- Não.
- Tudo bem, você já é um pistoleiro e pode tomar suas decisões.
  Rowan começou a acompanhar Steven até o portão de casa.
- Você não vai voltar até encontrar Clint?
- Não. - respondeu Steven. - Quando encontrá-lo, vou fazê-lo pagar por tudo.
- Cuidado, filho. Você sabe que ele é cheio de artimanhas.
- Eu agradeço, não vou cometer o erro de deixá-lo escapar pela segunda vez.
  Steven deu um abraço no pai e montou em Dash.
- Até outro dia, pai.
- Longos dias e belas noites, pistoleiro.
  Steven começou a galopar para a saída da cidade.
- Não vá morrer. - disse Rowan.
- Não irei. - Disse Steven, e partiu, sempre olhando para frente. Sempre olhando para o futuro.
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Antes que alguém diga que eu devo continuar a história, ela foi feita pra continuar no rpg, então eu não pensei em nenhuma continuação. Mas isso não quer dizer que eu não vá mudar de idéia. =p
Espero que tenham gostado.